Esta República (leia-se, regime iniciado em Abril de 1974) já deu o que tinha a dar.
A culpa foi dos capitães de Abril que se lançaram numa aventura a que chamaram revolução, sem prepararem "A Revolução", não medindo as consequências aos diversos níveis que necessariamente deveria ter sido fácil perceber iria verificar-se. Deixaram-nos de positivo a Democracia, mas a que preço, Deus meu!
A culpa foi dos presidentes da república, de todos os que tivemos até ao actual, que exerceram a primeira magistratura a olhar para a segunda, e nesta a tentarem ser primeiros ministros.
A culpa foi dos primeiros ministros e dos ministros e restantes equipas dos seus governos, de todos os que tivemos até aos actuais, porque parece terem aceite a tarefa, que devia ser a de governar a coisa pública, para fazerem política baixa e de clientelas garantidas, em vez das necessárias, por mais duras que fossem, propiciando a que comunidade portuguesa levantasse de um voo rasteiro que o anterior regime lhes ensinara a voar; não a olhar para megalomanias irreais para um país como nosso, ainda por cima donde ficaram fumos (com poucas excepções) de, a coberto de medidas ditas a bem de toda a comunidade, só a alguns parece terem engordado.
A culpa foi dos parlamentares de todas as legislaturas, de todos os que tivemos até aos actuais, enquanto detentores do poder constitucional que lhes garantia poderem tomar as melhores medidas legislativas orientadoras para toda a comunidade, debatendo as situações com verdade e honestidade, sem recurso, sempre em crescendo, a chicana no discurso e nos objectivos.
A culpa tem sido dos partidos políticos que têm aparecido no nosso mosaico parlamentar porque, com o tempo, se tornaram todos iguais nos objectivos por que lutam (não disse ideais, porque nenhum parece já saber o que isso é), na forma de fazer politica, no discurso repetitivo e gasto de más provas dadas, mas sempre teimosos a dar mais do mesmo, violando leis de que foram a fábrica, o armazem e o estabelecimento comercial de venda ao consumo.
A culpa tem sido das taínhas que vivem nos e dos partidos políticos e, muito especialmente, de quem os deixa navegar à babugem.
A culpa tem sido das empresas corruptoras e dos corrompidos, que engordam ilícita e egoisticamente, quando as tarefas são, ou deveriam ser, de âmbito e interesse nacional. Dos que engoliram e ajudaram a engolir os milhões de euros que aportaram à costa nacional, sem deixar rasto de desenvolvimento de costumes, de educação, de investigação científica e de economia.
A culpa tem sido de quem intervém nos órgãos de comunicação social, porque saídos dos mesmo forno que está a acabar, pensaram que informar é dar palpites sem estudar, é lançar suspeitas sobre cidadãos sem investigar, é ficarem cegos pelos focos das cameras.
A culpa tem sido dos magistrados, dos judiciais e dos públicos, que também se deixaram enredar no turbilhão do tudo vale para ter um segundo de atenção na TV, na rádio e na imprensa.
A culpa tem sido de todos nós, novamente eles incluídos, porque temos preferido dar passos a descer, que são mais fáceis, mesmo que o fim da descida esteja ali mesmo à vista e a seguir se veja o precipício sem escapatória possível, a uma caminhada serra acima, mais longa, mais difícil, mas com futuro melhor e garantido; do melhor agora, mesmo que se esgote num segundo, do que trabalhar para um depois mais longo, conduta que foi assente na adquirida sensação de que se assim não for, "eles comem tudo e não deixam nada".
É tempo de mudança, é tempo de mudar de rumo, e muito rapidamente. Os 800 anos que temos da mais velha nação europeia estável nas fronteiras e na cultura, não serão garantia de que continuaremos a sê-lo nos próximos 800 minutos. O potente e pesado cilindro da globalização e do poder que o colocou nesta nova marcha, de há meia dúzia de anos, não nos vai perdoar e ficaremos todos esmagados.
É tempo de se pensar em eleger uma Assembleia Constituinte ex-novo, à parte da AR que deverá continuar em funções, pescada de gente que saiba e consiga pensar Portugal para lá de lutas partidárias, com o objectivo de pensar Portugal a longo prazo e um novo rumo a curto-médio prazo, para fundar uma nova democracia, assente em linhas claras, órgãos eficientes, administração pública magra mas funcionalmente definida, com as actividades privadas sem pecados públicos e vice-versa, com pessoas e cargos responsáveis, responsabilizáveis e responsabilizados, com educação massificada mas não embrutalhada, com saúde pública tendencialmente gratuita, porque a saúde é rigorosamente de interesse público, com magistrados que exerçam a justiça em vez de se lançarem em lutas de operariado e passadas partidárias, com autoridades policiais que o sejam e possam ser, sem abusar, uma nova democracia em que todos e cada um dos que nela estejam tenham imbuídos os sentimentos de partilha, trabalho, liberdade, responsabilidade sempre presentes, na certeza de que o que é bom para a comunidade portuguesa, vai e terá que ser bom para cada um dos que a ela pertence. Uma nova democracia da qual renasçam partidos políticos constituídos por gente que saiba por que eles existem e porque é que eles podem deixar de existir.